Democracia, Cidadania e Organização do Estado

A defesa da Democracia tem de ser uma prioridade colectiva e contínua e faz-se, na nossa perspectiva, tanto com um maior envolvimento dos cidadãos na vida pública, como com a adopção de políticas que reforcem a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas. Nesse sentido, o PAN identifica cinco princípios que considera estruturantes na consolidação da Democracia, a saber, um sistema político mais transparente, uma Administração Pública mais capaz, um Poder local mais presente, mais e melhor participação cidadã e um sistema eleitoral agregador.

A existência de uma Administração Pública credível, profissionalizada, tecnicamente preparada e independente de quaisquer intromissões do poder político é condição essencial para uma melhor satisfação das necessidades dos cidadãos. Nessa perspectiva, consideramos imperioso apostar no reforço da qualidade dos cargos dirigentes, o que se atinge através do reforço substancial das condições e das funções da entidade contratante, tendo em vista o aprofundamento do seu papel no recrutamento e selecção dos cargos dirigentes.

No que respeita ao Poder Local e às matérias a ele respeitante, antecipamos que a próxima Legislatura assumirá um papel preponderante. Acreditamos num poder local próximo das populações, que dê resposta aos anseios e necessidades dos cidadãos. Nesse sentido, consideramos imprescindível que sejam dados passos firmes na consolidação do processo de Descentralização em curso, o qual, acreditamos, tem de ser feito pela Assembleia da República de forma ponderada e cuidada, envolvendo os Municípios, e deve contemplar uma avaliação crítica dos resultados da primeira fase do processo, devendo igualmente prever os recursos financeiros necessários e adequados ao exercício das competências transferidas. 

Ainda ao nível do Poder Local, cumpre concretizar a revisão da legislação autárquica estruturante, que deverá ser ambiciosa e não deverá ficar-se por meras alterações de pormenor, devendo ser encarada como a principal prioridade do debate político em matéria do poder local da próxima Legislatura. Nesse sentido, propomo-nos a introduzir um conjunto de alterações no sentido de conseguir um reforço da democracia local, o reforço (e efectividade) dos direitos de oposição nas Autarquias Locais, o reforço dos mecanismos de democracia participativa no plano autárquico e a garantia das condições de funcionamento adequadas ao bom desempenho das missões conferidas aos órgãos locais e aos seus membros.

Por último, ao nível da participação democrática e do exercício da cidadania, consideramos ser verdadeiramente crucial apostar em políticas que contrariem as elevadíssimas taxas de abstenção verificadas após cada acto eleitoral e devolvam a confiança e vontade de participação democrática aos cidadãos. Acreditamos genuinamente que os cidadãos querem mais democracia e estão dispostas a repensar o modo como se envolvem e actuam na sociedade, pelo que nos cabe, a todos, dar cumprimento a esse desejo e reforçar a democracia participativa e criar novas ferramentas para a governança conjunta. Consideramos, neste particular, que é imprescindível empoderar os mais jovens e convidá-los a participar, numa óptica de construção colectiva de sociedade e atentos os enormes desafios com que nos deparamos, na melhoria do nosso futuro colectivo, razão pela qual as nossas propostas vão no sentido de uma maior justiça intergeracional.

Sistema político

Propomo-nos igualmente a melhorar o sistema político, o que fazemos através de propostas que vão no sentido de um maior escrutínio dos titulares de cargos políticos, com consequente empoderamento das entidades fiscalizadoras e do cidadão e com a implementação de regras que aumentem o compromisso da classe política para com o país e para com os cargos de representação que ocupam. 

  • Consagrar a obrigatoriedade do regime de exclusividade dos deputados à Assembleia da República, em termos similares ao que existe actualmente quanto aos membros do Governo, de modo a assegurar-se a sua dedicação exclusiva à função representativa dos cidadãos e a evitar-se a existência de possíveis ligações promíscuas com interesses económicos
  • Consagrar a limitação de mandatos de todos os cargos de órgãos electivos do poder político, o que incluirá, designadamente, Deputados à Assembleia da República, Vereadores nas Câmaras Municipais, Vogais de Junta de Freguesia, Membros de Assembleia Municipal e Membros de Assembleia de Freguesia, com o intuito de combater os riscos inerentes ao excessivo prolongamento no poder
  • Defender, designadamente em Orçamento do Estado, que o Tribunal Constitucional, a Entidade da Transparência e a Entidade das Contas e Financiamento dos Partidos dispõem dos meios e recursos necessários ao seu funcionamento e ao exercício eficaz das respectivas competências de supervisão sobre os partidos políticos e os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos
  • Atribuir à Entidade da Transparência competências para proceder a inquéritos a factos praticados no exercício das funções parlamentares, que possam consubstanciar eventuais irregularidades por violação dos deveres dos Deputados, atribuindo-lhe igualmente o poder de aplicar sanções em virtude dessas irregularidades
  • Criar uma unidade técnica de apoio para as questões ligadas à Ciência e Tecnologia no quadro da Assembleia da República, de modo a garantir que os deputados estejam mais bem preparados para decidir de forma tecnicamente esclarecida sobre questões complexas e importantes
  • Assegurar que todas as iniciativas na Assembleia da República são sujeitas a uma avaliação de impacto ambiental, à semelhança do que já acontece para o impacto de género

 Administração Pública

Queremos igualmente contribuir para a melhoria da Administração Pública, o que se atinge, na nossa perspectiva, com processos de recrutamento mais justos e transparentes, com a criação de regras que optimizem os recursos existentes e com o reforço dos meios, humanos e materiais, que possibilitem maior celeridade e eficiência.

  • Reforçar a independência da Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (CReSAP), transformando-a numa entidade verdadeiramente independente, dotada de um quadro de pessoal próprio e de uma efectiva autonomia administrativa e financeira
  • Introduzir as alterações necessárias a assegurar que todos os processos de recrutamento e selecção dos altos cargos públicos passem a ter um papel mais activo da CReSAP, um maior escrutínio da Assembleia da República, mais transparência e um reforço da componente meritocrática da avaliação e recrutamento
  • Consagrar o limite de renovações das comissões de serviço dos cargos de direcção intermédia para promover a sua renovação e o acesso de jovens a estes cargos e, posteriormente, também o acesso a cargos de direcção superior 
  • Assegurar que, no caso de o dirigente que está a ocupar um cargo em regime de substituição ser o escolhido pelo Governo no final do procedimento concursal para provimento de um cargo dirigente, o tempo de substituição seja contabilizado como tempo de duração da comissão de serviço para aferição dos limites globais de duração da comissão de serviços
  • Consagrar um prazo máximo de 90 dias para a duração da ocupação de um cargo dirigente em regime de substituição, equiparando-o ao regime da gestão corrente, de modo a evitar-se que a substituição dure por um período excessivo
  • Constituir um grupo de trabalho na Assembleia da República para a discussão alargada sobre a possibilidade de se introduzirem um conjunto de alterações às regras dos procedimentos concursais para o recrutamento de trabalhadores da função pública que assegurem a existência de processos de recrutamento mais rápidos, mais transparentes, justos e livres de eventuais favorecimentos concedidos em função de ligações políticas ou familiares 
  • Pugnar pelo fim da possibilidade das cativações de verbas e da necessidade de autorização do Governo para celebração de contratos, realização de despesa ou para a contratação de trabalhadores nas Entidades Reguladoras, com o intuito de se assegurar que existem entidades reguladoras verdadeiramente independentes (dos regulados e do Governo), procurando garantir as condições mínimas necessárias a uma melhor persecução do interesse público e de uma maior garantia dos direitos dos cidadãos e das cidadãs

Poder local

A crescente transferência de competências para o poder local, que operará até 2021 e com a qual o PAN genericamente concorda, não obstante as reservas que tem apresentado no debate autárquico, exigirá particular atenção na próxima legislatura, sendo que considera fundamental que a capacitação das autarquias seja acompanhada, quer de alterações ao nível do funcionamento das mesmas, quer da definição de regras que aumentem o escrutínio sobre os responsáveis autárquicos e fomentem a pluralidade democrática.

  • Alterar a legislação que permite a presença dos Presidentes de Junta de Freguesia nas Assembleias Municipais como membros por inerência, mantendo-os como membros, mas sem direito de voto
  • Rever o Regime de Financiamento das Autarquias Locais no sentido de penalizar financeiramente todas as autarquias que, deliberadamente, tenham contribuído para obstaculizar ao cumprimento de disposições legais emanadas pela Assembleia de República ou do Governo da República, não desenvolvendo internamente planos de cumprimento adequados
  • Reforçar as competências das Assembleias Municipais, designadamente através do reconhecimento da possibilidade de apresentarem e aprovarem propostas de alteração às propostas de orçamento apresentadas pela Câmara Municipal
  • Reforçar as competências das Assembleias Municipais, designadamente através do reconhecimento de uma eficácia prática à aprovação de uma moção de censura por via da aprovação de um regime jurídico que regule a cessação de funções da Câmara Municipal 
  • Alargar o direito de consulta prévia das forças da oposição nas Autarquias Locais a outros assuntos autárquicos estruturantes, tais como o exercício dos poderes tributários do município, a revisão dos instrumentos de gestão territorial ou certas questões ligadas ao sector empresarial local
  • Consagrar a obrigatoriedade legal das Autarquias Locais reservarem nas suas publicações periódicas, e nos sítios institucionais, espaços para que os titulares do Direito de Oposição possam difundir as suas posições sobre os diferentes assuntos de interesse local e o seu trabalho
  • Consagrar o direito dos eleitos nas Assembleias Municipais e dos respectivos Grupos Municipais deterem as condições adequadas para o exercício das suas funções (o que incluirá, designadamente, o direito a assessoria técnica, o direito a gabinete próprio ou o direito a mais tempo para análise dos documento sujeitos à apreciação da Assembleia Municipal), algo que visa assegurar que estes eleitos possam desempenhar de forma eficaz as respectivas funções
  • Criar uma entidade administrativa independente que centralize as competências de interpretação e monitorização do cumprimento da legislação reguladora da democracia local e dos direitos de oposição e que eventualmente sancione os casos de incumprimento de tal legislação
  • Constituir um grupo de trabalho na Assembleia da República para, através de um leque alargado de audições, avaliar e monitorizar o processo de descentralização em curso e os seus resultados, assim como realizar a discussão aprofundada sobre a consolidação deste processo de descentralização e as alterações da legislação autárquica estruturante previstas para 2021

Democracia participativa e cidadania activa

Queremos igualmente promover a participação democrática, porquanto urge combater o distanciamento cada vez maior dos cidadãos do debate público. Consideramos imperioso empoderar os cidadãos, dar-lhes voz e, tão ou mais importante, adoptar mecanismos efectivos para que essa voz seja ouvida.

  • Dinamizar o regime jurídico dos referendos locais através de uma reforma legislativa que introduza um direito de iniciativa popular directa de referendo local e que abra a discussão sobre o fim da fiscalização preventiva obrigatória da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional relativamente a estes referendos
  • Criar uma Lei que assegure um enquadramento legal de carácter geral dos orçamentos participativos nas Autarquias Locais e que crie incentivos ao desenvolvimento destes processos nas Autarquias Locais (eventualmente com fundos específicos associados)
  • Reduzir o número mínimo de subscritores das Iniciativas Legislativas de Cidadãos, alargando as matérias abrangidas e adoptando um processo de submissão/subscrição mais simples
  • Consagrar o direito potestativo dos cidadãos, cumpridas certas formalidades, inserirem na ordem do dia das reuniões das assembleias deliberativas das Autarquias Locais uma questão ou proposta de deliberação inserida no âmbito das competências do respectivo órgão, algo que visa garantir um processo mais simples, garantístico e democrático, que afaste a lógica burocrática que marca o actual modelo
  • Assegurar a participação efectiva dos cidadãos no procedimento de formação dos actos legislativos do Governo, alargando o prazo legal de consulta directa e inscrevendo legalmente um prazo mínimo de consulta pública não inferior a 45 dias
  • Desenvolver e implementar ferramentas acessíveis, especialmente dirigidas aos cidadãos, que permitam o acompanhamento e a monitorização da execução do Orçamento de Estado
  • Promover a capacitação das ONGs, facilitando o acesso aos apoios públicos e privados disponíveis para todas as áreas de intervenção social, criando um portal, de acesso livre e universal, que reúna toda a informação sobre os fundos e outras formas de suporte existentes, procedimentos de acesso e demais informação correlacionada, bem como aconselhamento e apoio às candidaturas
  • Rever a Lei de Bases do Voluntariado tendo em vista alterar toda a visão jurídica, institucional e social do voluntariado, actualizando e adequando o seu papel na economia social e solidária, reconhecendo-o como fonte de educação, solidariedade e coesão social e de promoção de cidadania activa
  • Reforçar os recursos humanos e materiais nos consulados
  • Desenvolvimento de uma aplicação (App) para serviços consulares
  • Alargamento das mesas de voto nos círculos Europa e Fora da Europa

Sistema eleitoral

A democracia faz parte do ADN do PAN. Por isso, e porque queremos uma democracia mais participada, defenderemos o alargamento aos maiores de 16 anos do direito de sufrágio. Sabendo que há, em cada eleição legislativa, cerca de meio milhão de votos válidos que não resultam na eleição de qualquer deputado, pretendemos diminuir substancialmente esse desperdício através da redução do número de círculos eleitorais de 22 para 9. Em simultâneo, propomos a alteração do método matemático usado na definição do número de mandatos por círculo, trocando o método de Hondt pelo método de Sainte-Laguë, para deste modo beneficiar os círculos de menor dimensão – que muitas vezes correspondem a territórios imensos, mas com menor densidade populacional (ver tema da Revisão Constitucional). 

Defendemos ainda a melhoria dos processos associados ao voto antecipado e ao voto em mobilidade, pelo potencial que estes têm de contribuir para a redução das taxas de abstenção.


Com estas alterações, haverá uma maior correspondência entre a vontade expressa pelos cidadãos e a composição do hemiciclo, bem como uma discriminação positiva das regiões mais despovoadas e uma melhoria geral do processo democrático.

  • Prosseguir e aprofundar as melhorias do regime do voto antecipado introduzidas na última Legislatura, nomeadamente criando condições para assegurar o seu alargamento, a existência de um maior número de mesas de voto e uma maior eficácia e organização do processo

Revisão Constitucional

O texto fundamental não é uma construção imutável. Deve, pelo contrário, responder à evolução da sociedade e às preocupações e anseios dos cidadãos nos diversos tempos, assim como aos diferentes graus de conhecimento que vamos logrando obter nas mais variadas matérias e aos enormes desafios com que nos deparamos. E a verdade é que são vários e exigentes os desafios que temos pela frente, nomeadamente ao nível da preservação do Planeta e, por conseguinte, da nossa e das demais espécies, mas não só, também ao nível social, com um conjunto de novos valores a que urge dar dignidade constitucional. Consideramos crucial abrir um processo de revisão constitucional, sendo que a nossa proposta vai no sentido de uma Constituição mais moderna e progressista, optimizadora da Democracia, em total respeito pelo Estado de Direito democrático e pelos direitos fundamentais dos cidadãos.

  • Conferir valor próprio à natureza, alterando a actual visão antropocêntrica
  • Incluir a identidade de género, expressão de género e características sexuais no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa
  • Consagrar o direito de sufrágio aos cidadãos maiores de 16 anos
  • Reduzir o número de círculos eleitorais para nove – Norte, Centro, Alentejo, Algarve, Área Metropolitana do Porto, Área Metropolitana de Lisboa, Açores, Madeira, Emigração – e alterar o método matemático usado na distribuição prévia dos mandatos por círculo de modo a favorecer os círculos de menor dimensão (ver tema Sistema eleitoral)
  • Alterar o modelo de nomeação do Procurador-Geral da República e do Presidente do Tribunal de Contas, para que estes passem a ser indicados pela Assembleia da República
  • Criar tribunais especializados para o julgamento dos crimes cometidos no exercício de funções públicas, nomeadamente os crimes de corrupção, peculato e abuso de poder e para o crime de violência doméstica, ampliando para tal o alcance da excepção prevista no n.º 4 do artigo 209.º da Constituição da República Portuguesa
  • Consagrar o reconhecimento da senciência dos animais