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OPINIÃO | MOUCHÃO DA PÓVOA: A PASSIVIDADE NA PROTEÇÃO DA NATUREZA

Adélia Gominho, autarca do PAN em Vila Franca de Xira

Cresci a olhar para o rio e para o Mouchão da Póvoa, que é parte integrante da Reserva Natural do Estuário do Tejo, sob tutela do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

O Tejo tem vários problemas identificados: desde as águas transvasadas das quais parte em Espanha, às inúmeras barreiras que encontra em todo o seu percurso – como as barragens que têm impedido o seu curso natural, desviado-o em alguns locais – aos atentados ambientais – de várias formas e focos de poluição – dos quais tem sido alvo nos último anos: despejos nos seus afluentes, escorrências de minas e de Estações de Tratamento de Águas Residuais e descargas industriais poluentes diretamente nas suas margens. Assistimos a tudo isto sem que comissões de acompanhamento produzam e divulguem dados concretos, sistematizados e públicos, de fácil acesso aos cidadãos e às cidadãs.

Não obstante vários instrumentos de ordenamento do território, a sua classificação e proteção por ser parte integrante da Reserva Agrícola Nacional e da Reserva Ecológica Nacional, a história do mouchão que desde 2016 está cada vez mais alagado, só é possível graças ao empurrar de responsabilidades de instância em instância, perante a passividade de quem deveria agir – o Ministério do Ambiente e da Ação Climática.

Estas ilhotas do Tejo, os mouchões, têm ao longo dos anos deixado de parte a sua vocação agrícola, por vezes na mira de interesses turísticos que, até agora, não se concretizaram, mas que os podem eventualmente deixar à mercê da falta de manutenção. Resultado? O mouchão da Póvoa está neste momento quase submerso, o que tem implicações em toda a região – por exemplo, o aumento da salinização das águas muitos quilómetros rio adentro, com consequências futuras também na agricultura de proximidade e na nossa soberania alimentar.

Sendo o Tejo um desafio perante as alterações climáticas que aceleram, devido sobretudo à ação humana, não deixa de ser encarado como um recurso económico, um ativo para extrair, usar, poluir, sem atenção  às consequências futuras e nas gerações vindouras que tais opções políticas vão causar. 

Porque razão numa reserva natural não se atuou com emergência e prudência, assim que se percebeu o rombo no dique do Mouchão da Póvoa? A passividade vai custar-nos caro, uma vez mais. Andou a Agência Portuguesa do Ambiente sucessivamente de levantamento topográfico em levantamento hidrográfico,  vimos, com pompa e circunstância, levantar-se a placa a anunciar a obra, vimos a fotografia de propaganda habitual, mas não vimos o mais importante: a efetiva reparação do dique e a recuperação dos terrenos.

Para quando o inteiro apuramento de responsabilidades em todo este processo? Quanto mais não seja para que seja caso (não) exemplo, para não se repetir noutras situações, pois pouca esperança já temos em ver consequências políticas e legais de tanta passividade.