Lisboa

Da era da separação para a era da união – do Ego para o Ecossistema

A PAZ NA INTERDIVERSIDADE

PARA UM PRAGMATISMO ACOLHEDOR

“Da era da separação para a era da união – do Ego para o Ecossistema”

O grupo municipal do PAN quer antes do mais agradecer às diversas entidades que connosco sob várias formas, aceitaram o desafio de colaborar na organização deste evento dentro da semana “World Interfaith Harmony Week“. Agradeço igualmente a todos os que se disponibilizaram a enriquecer este encontro participando nos diversos painéis ou apenas assistindo e intervindo.

Poderão perguntar-se porquê levantar-se este tema numa cidade que tem sido, nos últimos tempos e que aos refugiados diz respeito, exemplar no seu relacionamento com o Outro? A resposta clara é que as características das nossas sociedades que desejamos ver crescer e consolidar devem ser continuamente cuidadas, acarinhadas e cultivadas, ou como dissemos nos documentos de divulgação deste nosso encontro, justificando-se pois pela necessidade de uma ação pragmática alicerçada na promoção de valores e práticas que contribuam efetivamente para que os cidadãos e aqueles que, direta e indiretamente detêm responsabilidades nas diferentes áreas de intervenção na Cidade de Lisboa, possam assumir um compromisso de cooperação para uma educação da cultura de paz.Todos somos capazes do melhor e do pior, e tragédias como as ocorridas ao longo dos séculos na nossa cidade, estão apenas à distância dum pensamento mais intolerante ou da falta de cuidado com o Outro.

Estamos a atravessar um momento histórico particularmente difícil, para quem acredita na hipótese dos campos morfogenéticos, a onda de intolerância que varre o planeta pode ser desse ponto de vista (morfogenético) suficientemente poderosa para fazer vacilar as consciências menos ancoradas numa prática do cuidado e reconhecimento doOutro.

E quem é este Outrode que falamos senão nós próprios quando visto por outros olhos?

É na sequência desta pergunta que surge esta reflexão “Da era da separação para a era da união – do Ego para o Ecossistema”.

Grande parte de nós identifica-se apenas com o organismo corpo-mente que se reconhece desde tenra idade. Vemo-nos como seres limitados/delimitados e mortais, separados de tudo e de todos, entidades individuais que nasceram de determinados pais e que numa dada altura se extinguirão. E como não conseguimos ultrapassar esta visão limitada e limitante de nós próprios, mais facilmente caímos nas armadilhas da ilusão da separatividade. A ilusão de que podemos querer o fracasso dos outros sem que isso tenha consequências em nós próprios, a ilusão de que podemos servir-nos e destruir o mundo natural de que fazemos parte, sem que isso tenha identicamente consequências sobre nós. Esta ilusão da separação, co-cria a ilusão de uma certa impunidade inerente, faz-nos entrar em conflito com o Outroe com a Naturezada qual fazemos parte, destruindo desta forma as condições para a fruição da Paz. Quando conseguirmos afastar de nós esta ilusão, percebemos que tornar as pessoas e os animais mais felizes assim como regenerar a restante Natureza com todos os seus ecossistemas, cria as condições para o estabelecimento e vivência da verdadeira Paz e harmonia.

Quando compreendermos de forma sentida e não dogmática que cuidar de toda a Natureza onde estamos incluídos é o mesmo que cuidar de nós, estamos a dar passos de gigante no sentido da Paz global.

Em vez do atrás exposto, deixamos que a terra, o ar e os oceanos continuem a ser globalmente conspurcados, porque na nossa visão limitada de nós próprios, vamos conseguindo arranjar cantinhos que ainda nos são aprazíveis, desconsiderando que há muito tempo outros cantinhos deixaram de ser aprazíveis para alguém, e que como tal, para além de estarmos a agredir os ecossistemas globais dos quais fazemos parte, estamos também a agredir um antigo cantinho aprazível de alguém e, como consequência estamos a destruir a Paz de alguém que consequentemente destruirá a nossa. Quanto tempo imaginam que isto poderá continuar?

Passando do mundo material para o espiritual, a ligação fundamental entre todos e entre todos nós e o e o Divino, foi ao longo da história conjugado de diversas formas decorrendo daqui  o aparecimento de religiões e epifanias associadas. A busca duma unidade primordial ou a existência duma mónada foi testemunhada em várias tradições planetárias ao longo da história do Ocidente ao Oriente. A grande diferença para os dias de hoje é que devido à própria globalização vemos as suas evidências e uma não separatividade a desenrolarem-se à frente dos nossos olhos.

Seja nas inter-relações de carácter ecológico, seja no domínio da política, seja no domínio da religião, a nossa tendência é recorrentemente pensar no nosso Ego como uma entidade tridimensional engajada numa luta com o mundo objectivo, do qual se sente completamente separada. Do que vimos atrás, a lógica subjacente à ecologia sugere-nos que este Ego está ele próprio afastado das verdades duma ligação universal primordial, e que este Ego, chamemos-lhe “mal educado” perpetua mecanismos de separação que conduzem à ausência de Paz e poderão com facilidade dar origem a guerras. Garantidamente contribui para a falta de Paz interior precursora de choques com o Outro.

Assim, para podermos começar individualmente a trabalhar a Paz, compete-nos pois educar este nosso inevitável Ego no sentido duma interacção responsável (co-responsável) com os outros Egos e com a nossa Casa Mãe, a Terra.

Isto, uma vez posto em prática, trás consequências efectivas não só no domínio da Ecologia como sugere o nosso título “do Ego para o Ecossistema”, mas também quando olhamos para o Ecossistema de um ponto de vista mais lato onde podemos incluir as interrelações Humanas, nas áreas da Religião e da Política.

No domínio da religião é fundamental que tenhamos a consciência que a pluralidade de interpretações religiosas que constituem o todo da opinião dum dado povo são de alguma forma uma riqueza interpretativa da forma como todos nos interligamos e como nos ligamos (ou não) com um princípio criador. Reconhecer esta riqueza, acarinhá-la e  garantir a sua preservação é essencial para que todos possamos sentir que a nossa visão do mundo é respeitada, e é esse sentimento em que todas as visões são respeitadas sem discriminação, que cria a Harmonia e a Paz entre todos.

Vemos assim que a verdadeira Paz não pode ser obtida pela supressão duma parte contra outra, mas antes pelo respeito do todo no respeito da sua inter-diversidade. Tal como já tínhamos referido atrás e sobretudo nas áreas em que tradicionalmente as diferenças mais foram extremadas é importante que a cultura diversa do todo possa também ser assumida pela parte. É deste sentir a tradição do Outro como de alguma forma parte de si próprio (mesmo que num sentimento parcial ou incompleto) que se podem afastar de forma consistente os riscos que podem atentar contra a Paz. Temos desta forma, uma Era de união na diversidade que vem substituir uma era de separação e conflito. Entramos assim numa Era em que o Ego não desaparece mas e uma vez educado assume numa forma orgânica, e em conjunto com outros Egos educados um verdadeiro ecossistema cultural e religioso.

E que dizer então da vertente política? Como conciliar na gestão da Polis todos as cambiantes tonais desta vertente. Aqui, o princípio mantém-se válido,  “do ego para o ecossistema”. Aqui, trabalhar para o ecossistema deverá ser educar o ego, passando pelo aprender quais as políticas que maximizam o Bem Comum de Pessoas e Natureza em geral, e em cada uma das propostas políticas diferenciadas refazer a sua interpretação desse mesmo Bem Comum, minimizando interesses particulares.

Resumindo, como chegámos a este ponto de separação entre nós e o mundo que nos rodeia com as consequências que vemos nas diversas áreas de actividade humana? Para além do atrás referido, importa dizer que o excesso de confiança que colocámos na nossa (deficiente) capacidade científica e analítica levou-nos a tentar suprir as nossas limitações e medos associados com atitudes de domínio sobre nós e a Natureza. Vemo-nos agora confrontados com as consequências destrutivas das nossas atitudes passadas. Compreender o que fizemos e alterar os nossos comportamentos é assim de elementar bom senso. Felizmente que estamos também numa outra fase da nossa capacidade científica e analítica e o que nos dizem hoje a física quântica, a biologia, a neurociência, sobre a matéria, faz-nos intuir uma outra concepção sobre o Homem, e essa profunda interconexão com uma dimensão espiritual e por consequência, com os outros e com o cosmos, radicada numa ética do cuidado que não é mais do que cuidar de cada um com as suas interconexões.
Estamos assim perante o aparecimento dum novo paradigma em que “Todos somos UM”, e que tudo o que fazemos tem impacto em nós, nos outros, no universo e volta a nós. Errámos sem dúvida muito mas fez parte dum processo de aprendizagem que agora pode ser utilizado para regenerar a Terra e as inter-relações humanas nos vários domínios.

Uma parte da Humanidade começa agora a ensaiar a saída da Era do Ego o que abre novas perspectivas para condições de Paz objectivas. A forma como cada um de nós irá abordar este desafio colectivo, ditará o seu resultado. Este, não é um processo instantâneo e tem associados avanços e recuos que são inerentes à condição Humana. Em contraponto a todos os erros, devemo-nos centrar nos inúmeros exemplos positivos que encontramos ao longo da História e interiorizar a concretização em nós deste novo paradigma que precisa do melhor de nós. Como diz o ditado, sê a transformação que procuras no Mundo, sejamos pois todos a Paz que procuramos ver no Mundo e na nossa cidade de Lisboa. Educar o Ego e cuidar do próximo, seja o próximo o Humano com quem lidamos ou todos os seres e ecossistemas do mundo natural.

Lisboa, 3 de Fevereiro de 2017

Pessoas – Animais – Natureza

(GM PAN)

Miguel Santos

https://www.youtube.com/watch?v=TXckaNrcVqQ