Há mar e mar, há ir e voltar. A frase da autoria do poeta Alexandre O’Neil foi criada como slogan publicitário para o Instituto de Socorros Náufragos, mas rapidamente ganhou dimensão macro e popularizou-se no léxico português, com derivação da sua original conotação.
O construto inicial da frase de O’Neil tinha como propósito alertar para os perigos do mar, que não é todo igual na manifestação da sua força e intensidade, e apelar à cautela para que fosse possível regressar incólume do seu leito.
Os perigos que se instam e que agora enfrentamos não são o mar, per si, mas a sua gestão, e a cautela que se exige prende-se com os tiques centralistas que nos retiram, reiteradamente, competências e emitem atestados de ineptidão.
A Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional foi ao crivo do Tribunal Constitucional e voltou com emendas. A inconstitucionalidade decretada às normas que conferem às Regiões Autónomas a gestão partilhada do seu território marítimo vem pôr a nu, uma vez mais, os tiques centralistas do órgão máximo de justiça portuguesa.
Uma decisão que vem acompanhando a leitura várias vezes tida em decisões proferidas sobre os assuntos do mar. A perda de autonomia sobre a gestão do nosso património e dos nossos recursos marinhos parece-me
A gestão partilhada do mar português é um tema quase tão antigo quanto o slogan de Alexandre O’Neill, mas que ganha cada vez maiores contornos, principalmente o Mar dos Açores, por toda a riqueza que representa e que é já conhecida, e a que se sabe que ainda falta explorar (e minerar).
Importa relembrar que Portugal, apesar de ser apenas o 16º maior país da Europa, considerando a sua dimensão terreste (92 mil km²), é o 5º maior em termos de extensão marítima (1,7 milhões de km²), e muito dessa extensão é consignada em razão dos dois arquipélagos atlânticos. A Zona Económica Exclusiva pertencente a Portugal representa 95% do total da dimensão territorial portuguesa e assume-se como 3ª maior da União Europeia, representando 11% do seu total.
Esta decisão deixa-nos ainda mais apreensivos quando, ao mesmo tempo que o Primeiro-Ministro deixou o compromisso político de classificar 30% da nossa área marinha e proteger as águas marinhas portuguesas, deixa também entreaberta a porta à mineração do mar profundo.
Os interesses nacionais fazem “tábua rasa” dos poderes autonómicos sobre a gestão de espaços marítimos regionais, e relegam a intervenção sobre o que é nosso! Não somos aptos a cogerir o nosso espaço marítimo, mas seremos nós os primeiros e principais a sentir as consequências da sua (in)gerência.
Com isto, e para que não sejamos engolidos, novamente, pela onda centralista, e para a nossa autonomia não morrer na praia, há que priorizar a revisão constitucional, de forma a clarificar as competências das regiões autónomas e evitar novos belisques. Pela defesa da nossa autonomia! Pela defesa do nosso mar!