A arquitectura tem origem na fixação humana ao território, evoluindo através da história, adaptando a materialização ao pensamento e às correntes arquitetónicas e artísticas. Encaro o trabalho do arquitecto não como uma mera súmula programática a cumprir ou uma linguagem hermética isolada do projecto final e da forma como é percepcionada. É um trabalho de especulação prática e teórica, uma decisão racional que inclui o tempo e espaço da realização, assim como, a experiência do próprio arquitecto. Será uma compreensão histórica “que emerge de uma experiência vivida por aquele que se propõe à tarefa de compreender ou interpretar alguma coisa”. Ante o produto final, as percepções não são unânimes, até porque a linguagem estética é variável e subjectiva.
A realização de obras nas cidades, organismos vivos e em mutação, adaptam sua anatomia à realidade, mas suscitam sempre debates e divergências, sobretudo porque actuam, também sobre património cultural, material e imaterial, gerador de identidade local.
A Horta não foge à regra. A nossa cidade está em mudança e nem sempre as alterações contentam todos, mas animam o debate que é, muitas vezes, tendencialmente partidário, mas que absorve contributos.
A grande obra de Requalificação da Frente-Mar que tocou em vários pontos sensíveis da cidade; a substituição do brasão de armas em frente ao Forte de Santa Cruz por um elemento mais moderno (agora reposto); a retirada do passeio de calçada portuguesa na Avenida Marginal que originou uma petição pela defesa do património modernista da cidade da Horta e, ainda, a nova apresentação do Jardim do Infante foram ora elogiadas, ora acusadas de falharem com a, discutível, autenticidade do contexto urbano original.
Contudo, devemos olhar os exemplos que centralizam a cidade na frente da discussão da inovação arquitectónica, tal como a candidatura vencedora do Banco das Artes para A New European Bauhaus no âmbito do Green Deal. Trata-se de uma experiência cultural centrada no ser humano, positiva e tangível para todos, promovendo a transformação e adaptação das nossas cidades, neste caso de um edifício, baseado em três princípios: sustentabilidade, estética e inclusão. Consiste num projecto de reabilitação de um edifício classificado com objetivo de criar um polo cultural e artístico de aglutinador das principais características ligadas à cidade: o mar e a comunidade, primando pelo espírito regenerativo e valorização da diversidade cultural.
Outro exemplo digno de referência é o Mercado enquanto Centro Empresarial do Faial, requalificado para a valorizar empresas sustentáveis do sector agro-alimentar da região. É agora um edifício multifuncional, honrando a dimensão humana que a história do comércio da cidade merece, é, também, novo centro de mostra de ideais, animação cultural e que conseguiu destacar um diálogo harmonioso com o Jardim da Praça da República.
Se a arquitectura é uma resposta às necessidades em mudança de todos os indivíduos, estes desempenham um papel essencial na defesa do espaço urbano e do seu património. As comunidades fazem despertar preocupações e sensibilidades no próprio poder decisório e a Horta deve continuar a reclamar a manutenção da sua memória histórica.