Lisboa

PELA DEMOCRACIA, PELA SAÚDE PÚBLICA, PELO AMBIENTE, PELA SOBERANIA DO GOVERNO, PELA AUTONOMIA DO PODER LOCAL

– Tratado Transatlântico e Parceria de Investimento (TTIP) –

No passado 19 de Abril trouxemos a esta assembleia municipal a Recomendação Declaração Simbólica de Lisboa como “Municipio Livre de TTIP” que mereceu a oposição do PNPN, PSD, CDS e, do PS com a justificação – e passamos a citar “ (…) para além de estar fora das competências municipais, é preciso perceber que (…) Quando houver um texto final, os governos e os membros do Parlamento Europeu vão ser os decisores da entrada em vigor, e da aprovação ou não, deste Tratado.”
Com todo o respeito, compreendemos esta posição que aliás coloca em evidência “o sacudir do capote” tão próprio da generalidade dos portugueses. Contudo meus caros colegas deputados, a Europa somos nós e é da vida de cada um nós que estamos a falar.
O que a seguir a este dia aconteceu veio mostrar mais uma vez que não podemos demitir-nos do direito à informação, do direito de tomar parte da decisão, de emitir opiniões e o direito a agir quando os representantes dos representantes, dos representantes decidem colocar acima dos governos, dos povos e do planeta, os interesses das grandes corporações sejam americanas, sejam europeias, como é o caso do TTIP. Mais do que um acordo comercial que ocupa apenas 4 capítulos de um total de 28, trata-se da conquista do poder pelas grandes corporações.
Mas voltando ao dia 19 de Abril. O que aconteceu depois deste dia?
Por entre a intensificação das manifestações contra o TTIP à escala mundial, no passado dia 2 de Maio o mundo inteiro teve acesso aos documentos tornados públicos pela mão da GreenPeace holandesa. Ficámos a saber que, estava a ser pensada a possibilidade do Parlamento Europeu não votar; que os governos pouco ou nada sabem sobre o Tratado que tem estado a ser negociado pela Comissão Europeia, e por fim pudémos de facto confirmar que este Tratado tem um forte impacto ao nível dos municípios, fazendo com que o EUROCITIES viesse já apresentar uma Declaração sobre a qual falarei mais à frente.
Sobre estes documentos tão polémicos, podemos dizer muito genericamente que se dividem em duas grandes partes:
1. Uma parte dedicada ao conjunto das propostas comerciais avançadas dos vários sectores abrangidos e que inclui o que se passou na última ronda negocial, sobretudo no tocante à “Cooperação Regulatória”;
2. Uma segunda parte, cuja existência era completamente desconhecida, dedicada ao que chamam o Estado do Jogo . Esta colocou não só em evidência o que nunca foi dito publicamente sobre as negociações em curso, bem como a total subserviência que existe dos comissários face às exigências americanas; a intransigência destes face às propostas europeias e, o impasse total face a diversos dossiers fundamentais.
E porque é que os cidadãos, governos e deputados europeus não tinham acesso às negociações, e as corporações eram consultadas sempre que tinham de tomar decisões que colocavam em causa os seus interesses e os seus lucros? Porque é que estas empresas têm de lucrar à da destruição do planeta , das pequenas e médias empresas nacionais e da saúde pública de todos nós? Porquê?
E porque temos tanta relutância em agir?
Será porque andamos demasiado ocupados com outros assuntos e nem vemos que este vai mudar por completo a vida de cada um de nós e que tem de ser travado enquanto estamos a tempo?
Falar de TTIP parece algo muito distante de nós para além de muito chato e enfadonho.
Todavia, de tudo o que nos foi dado a conhecer através dos documentos tornados públicos, vemos facilmente que não só os piores cenários se confirmaram, como inclusive se confirmou o maior impasse existente nas negociações: a Harmonização das normas e regras europeias com as americanas, sendo que a tentativa de harmonização é pela nivelação com as americanas. Reparem só?
1. Existem mais de 80 pesticidas nos EUA que são proibidos na Europa. Queremos harmonizar?
2. Os frangos nos EUA são lavados com lixivia e na Europa é proibido. Queremos harmonizar?
3. Quando importamos alimentos dos EUA, existe a obrigação de verificar a qualidade e conformidade dos produtos. Com o TTIP, a responsabilidade da inspeção transita para as empresas que exportam.
4. Quando contraímos doenças por ingerirmos produtos contaminados, os tribunais investigam e chamam as empresas para apurar responsabilidades. Pois bem com o TTIP, é possível a empresa invocar a não divulgação dos componentes dos produtos, pela lei do segredo comercial, e perante isto nada mais acontece.
5. Até recentemente os tratados eram negociados com base nas Listas Positivas. Os governos davam aos negociadores, as áreas comerciais para as quais o acordo era válido. Com o TTIP isto não é possível. Com o TTIP falamos de listas negativas, ou seja, os governos indicam as actividades económicas que querem ver fora do Tratado, ficando à mercê das Corporações todas as que não estejam lá claramente referidas incluindo todas as que ainda não foram registadas ou criadas.
6. Outro exemplo.
Os americanos não querem reconhecer as marcas dos produtos dos países de origem. Assim sendo, qualquer produto português pode ser descaradamente e legalmente copiado e colocado no mercado mais barato para rebentar com as marcas originais. Sublinhe-se que não temos qualquer capacidade para concorrer com uma economia de escala como a americana pelo que uma economia débil como a nossa será arrasada tal como aconteceu com o México com o Tratado NAFTA.

Caros colegas deputados, temos de agir e fazer o que está ao nosso alcance.
Quando falamos de TTIP falamos igualmente dos seus efeitos ao nível local. Já há muito que eram conhecidas as preocupações com a gestão dos serviços e concursos públicos, e com o impacto ao nível dos municípios.
Com os documentos publicados, confirma-se que o TTIP não é só um tratado negocial entre a Europa e os EUA, cujos problemas de incumprimento seriam dirimidos entre estas duas entidades à escala macro.
De acordo com o referido nos documentos, os EUA podem colocar o município de Lisboa ou qualquer uma Junta de Freguesia, em tribunal, por incumprimento do Tratado e prejuízo dos seus interesses económicos. E que tribunal é este? Enganam-se os que pensam que são os nossos tribunais nacionais ou europeus. Não. Será no Tribunal de Proteção ao Investimento (ICS), previsto no TTIP e no CETA.
Outro dado interessante é que as corporações podem processar-nos mas o contrário não.
Como podem ver estamos perante uma avalanche de informação que nos “caiu em cima” sobretudo no último mês. Vivemos um momento de grande charneira no qual todos os cidadãos, empresas, instituições públicas e governos são convocados a estarem vigilantes e a agir.
Preocupada com esta situação, a EUROCITIES – Uma Rede de Cidades Europeias da qual Lisboa faz parte – fez sair no passado dia 25 do corrente, uma Declaração sobre o TTIP e futuros Tratados. Em conjunto com esta Declaração é igualmente publicado um outro documento – Porque é que o TTIP importa para os Governos Locais – Resumo da Politica para as Eurocities .
Este documento, coloca em evidência como os governos locais não estão excluídos deste, e mostra uma forte preocupação com o impacto do TTIP nos municípios locais sobretudo no que concerne à preservação e gestão dos serviços públicos, aos concursos públicos e à proteção do investimento e dos interesses dos americanos.
E avança com um conjunto de recomendações à Comissão Europeia e aos Estados Membros, das quais sublinhamos muito rapidamente as seguintes:
a) Os governos locais devem ser amplamente informados e envolvidos no processo de negociação, porque diz respeito aos seus cidadãos e porque o TTIP os afecta de forma directa e indirecta;
b) Os governos locais devem ser especialmente consultados e notificados sobre as áreas das negociações que têm impacto direto sobre a sua politica e autonomia. Neste momento são prioritárias as áreas: sobre os serviços, os concursos ligados às compras e a proteção do investimento;
c) No que se refere a estas áreas a Eurocities recomenda ainda que os governos locais devem obter respostas claras em relação a um conjunto de questões que vos convidamos a consultar.

Sra. Presidente e Mesa desta Assembleia Municipal,
Sr. Presidente da Câmara e Vereadores,
olegas deputados de todos os grupos municipais,
pensamos que estamos todos a viver um momento histórico único em que a única exigência que nos é pedida, é termos a coragem de nos unir e olhar além das nossas diferenças, para podermos agir e caminhar no mesmo sentido.
Diz-se que ser-se resiliente é ser-se capaz, perante a adversidade, de lidar com ela de forma flexível e sem perder o foco; ser-se capaz de evoluir positivamente na situação.
O senhor Primeiro Ministro no debate quinzenal da Assembleia da República de 13 de Maio, já mostrou abertura para discutir esta matéria e por isso colocamos aqui à vossa consideração a Moção – Saudação e Voto de Confiança ao Governo pela posição de abertura à discussão na Assembleia da República do Acordo bilateral entre a Europa e os Estados Unidos – TTIP.
Mostremos agora a nossa resiliência e juntemo-nos a Madrid e às mais 1500 cidades europeias aprovando a Recomendação que hoje trazemos novamente a esta assembleia, para que simbolicamente Lisboa se declare como Município sem TTIP.
Acreditamos que 6 semanas volvidas desde 19 de Abril, com tudo o que já conhecemos, esta Recomendação merece hoje a aprovação inequívoca de todos nós.
Nós somos capazes!
Lisboa, 31 de maio de 2016.

O Grupo Municipal do PAN

Miguel Santos
(DM PAN)