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Recomendação: Transporte escolar e transição digital – ano escolar 2020/2021

Recomendação: Transporte escolar e transição digital – ano escolar 2020/2021

De acordo com Manuel Carmo Gomes, professor de Epidemiologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e um dos peritos ouvidos pelo Governo, numa recente entrevista ao jornal Público, estamos perante “o recrudescimento da epidemia de covid-19”, sendo possível que as escolas se tornem “o próximo epicentro de contágio”. Para este Epidemiologista estamos a assistir neste momento, e desde o início da última semana de agosto, ao aumento sustentado dos números, tendo passado de uma média semanal inferior a 300 casos por dia para mais de 500 desde 13 de setembro, sendo ainda de assinalar que as taxas de crescimento diário do número de casos, que estiveram entre os 0,2% e 0,6% (entre meados de julho a meados de agosto), recentemente ultrapassaram estes valores consistentemente, pelo que estamos a entrar no que possivelmente será uma “segunda onda”.

Assim, torna-se essencial olhar com redobrado cuidado para a comunidade escolar, nomeadamente nas matérias que possam já ser da esfera das competências da autarquia, designadamente o transporte escolar, o pessoal auxiliar, as instalações, entre outras áreas nas quais seja possível a atuação municipal, sempre em articulação com os agrupamentos de escolas, com a Direção-Geral de Saúde (DGS) e com o Ministério da Educação.

Estamos ainda em pleno início do ano escolar – um ano que já se sabe que será repleto de incertezas devido à crise sanitária e social que se vive, pelo que são urgentes medidas que transmitam serenidade e confiança à comunidade educativa.

Sabemos que o novo coronavírus alterou de forma direta os nossos comportamentos individuais, incluindo o modo como trabalhamos, nos deslocamos e até consumimos. O transporte público tem sido referido como um possível local para a disseminação global e local do vírus, motivo pelo qual é objeto de preocupações individuais e coletivas, verificando-se a redução do número de passageiros e a procura de alternativas, que podem ir da não deslocação quando possível à aquisição de bicicletas, passando pela partilha de veículos individuais por um número limitado de pessoas e pela continuidade do teletrabalho).

Também sabemos que o transporte de e para a escola de crianças e jovens é um elemento de grande impacto no tráfego da nossa cidade, como, aliás, refere a Visão Estratégica para a Mobilidade de Lisboa, aprovada na Assembleia Municipal de Lisboa, em janeiro de 2020, que inclusivamente define como objetivo “Melhorar a mobilidade de e para a escola”, o que “permitirá reduzir o número de viagens em veículo particular para a escola, por via da promoção do acesso em transporte público, modos suaves ou ridesharing, fomentando a segurança na envolvente das escolas e reduzindo a necessidade de utilização do veículo particular por parte das famílias”, considerando que “70% dos adultos que levam as crianças à escola fazem-no de transporte individual, com maior incidência na rede de ensino privado.

Assim, e dando resposta quer às alterações resultantes da crise sanitária, quer ao apelo mundial de redução da utilização de transporte individual motorizado, para além da implementação pelo município de outras medidas complementares (como a promoção e facilitação da utilização de modos suaves), neste momento é essencial garantir que o transporte escolar coletivo é realizado com a máxima segurança e em cumprimento das distintas medidas já emanadas sobre esta matéria[1], nomeadamente no que concerne ao cumprimento do intervalo e da distância de segurança entre passageiros (ex. um por banco); sinalização dos lugares onde as pessoas se devem sentar, de forma a garantir o distanciamento recomendado entre passageiros; lotação máxima de 2/3 da sua capacidade; disponibilização de solução antissética à base de álcool à entrada e saída da viatura e a descontaminação da viatura após cada viagem, segundo a Orientação 014/2020 da DGS.

A autarquia pode nesta matéria assumir e disponibilizar transporte escolar coletivo seguro a um maior número de alunas e alunos, abrangendo mais estabelecimentos escolares do município, minimizando desta forma o contacto destas crianças e jovens com outras pessoas no trajeto casa/escola e minorando os impactos ambientais ao facilitar o uso de transporte coletivo.

Neste início de ano relembramos ainda a necessidade de garantir que a transição digital das escolas se concretiza, de acordo com o previsto pelo Plano de Ação para a Transição Digital (Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2020, de 21 de abril) e pelo Programa de Estabilização Económica e Social (PEES, Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho), designadamente o sub pilar da «Educação Digital» integrado no Pilar III: Digitalização do Estado do Plano de Ação para a Transição Digital e a medida 3.2 «Universalização da Escola Digital» do PEES, na qual se prevê um investimento de 400 milhões de euros, oriundos de fundos comunitários, para a concretização de uma estratégia que permita a universalização do acesso por todas as alunas, alunos e docentes, aos distintos recursos didáticos e educativos digitais, nos diversos níveis de ensino.

Embora parte desta estratégia se refira a competências que extravasam as competências municipais, como a capacitação de docentes, desmaterialização de manuais escolares e elaboração de novos recursos digitais, as autarquias podem, porém, dar um maior contributo na necessária disponibilização de computadores, conetividade e outros serviços essenciais.

A Câmara de Lisboa já iniciou este percurso no decorrer deste ano, pois aprovou a aquisição de computadores e ‘routers’ para alunos do 1.º ciclo que não tivessem acesso a tais equipamentos, no âmbito do “Programa para redução das desigualdades dos alunos de 1.º ciclo das escolas do município”, com o objetivo de minimizar o impacto do encerramento das escolas a 16 de março devido à covid-19. Contudo, derivado do momento que vivíamos, o levantamento de necessidades então realizado pode estar aquém do necessário, podendo eventualmente não incluir as crianças que têm de partilhar equipamentos com irmãs e irmãos ou mesmos com pais e mães em teletrabalho.

Ora, não será excessivo, perante o atual cenário de subida dos valores de contágio, revisitar esta matéria de modo a garantir que as estudantes e os estudantes do município de Lisboa, em caso de necessidade, terão ao seu dispor as ferramentas necessárias, podendo agora abranger outros níveis de ensino para além do 1º ciclo.

Considerando que a autarquia pode ter um papel mais proativo na prevenção e controlo da transmissão de SARS-CoV-2, nomeadamente em contexto escolar, e face às presentes competências da autarquia na área da Educação, o Grupo Municipal do PAN propõe que a Assembleia Municipal de Lisboa, na sua Sessão Ordinária de 22 de setembro de 2020, delibere recomendar à Câmara Municipal de Lisboa, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 15º, conjugado com o n.º 3 do artigo 71º ambos do Regimento,:

  1. Dote, gradualmente, as escolas públicas,  sob gestão municipal, dos computadores e da conectividade necessários para o acesso e a utilização de recursos didáticos e educativos digitais por parte das alunas e alunos, bem como professores, garantindo a portabilidade desses recursos para outros locais, caso se torne necessário, com prioridade aos alunos beneficiários da ação social escolar e/ou que sejam devidamente sinalizados pela escola e juntas de freguesia, devendo ainda realizar novo levantamento de necessidades destes equipamentos;
  2. Elabore um plano de transporte escolar gratuito mais abrangente, que inclua os distintos estabelecimentos escolares do município e os vários níveis de ensino, cumprindo as medidas e orientações emanadas pela DGS, bem como outras que venham a surgir, em paralelo com a necessária estratégia de incentivo dos modos suaves.

Caso seja aprovada, enviar a presente recomendação a todos os grupos de cidadãs e cidadãos e organizações não governamentais ligadas às áreas do ambiente e associações de encarregados de educação.

Lisboa, 17 de setembro de 2020.

O Grupo Municipal
do Pessoas – Animais – Natureza

Miguel Santos – Inês de Sousa Real


[1] O transporte escolar deve cumprir as orientações presentes na Orientação 025/2020 da DGS e as recomendações da Orientação 027/2020 da DGS.